Consumidor vai pagar por empréstimo bilionário ao setor elétrico

Consumidor vai pagar por empréstimo bilionário ao setor elétrico

A diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou, na terça-feira (15/3), um novo empréstimo ao setor elétrico para cobrir os custos da crise energética do ano passado. O total chega a R$ 10,5 bilhões, e o ressarcimento às empresas geradoras será dividido em duas partes, sendo a primeira parcela de R$ 5,3 bilhões. Mas se este ano o consumidor terá algum alívio, poupado de um pesado repasse nas tarifas de luz, para 2023 não tem jeito a conta será paga por toda a sociedade.

Segundo a Aneel, a liberação dos recursos para as elétricas deve sair até a primeira quinzena de abril e o financiamento terá duração de 54 meses, a ser repassado nas contas de luz. O pesado impacto no bolso do cidadão se deve, sobretudo, ao fato de que o financiamento será levantado junto a bancos públicos e privados, o que envolve pagamento de juros a taxa não está fechada com as instituições das quais o dinheiro será tomado.

Os R$ 5,3 bilhões da primeira parcela cobrirão os seguintes fatores relacionados à crise hídrica de 2021: R$ 540 milhões relativos ao prejuízo causado pelas bandeiras tarifárias, que ficaram abaixo da arrecadação calculada; R$ 1,6 bilhão do bônus pago aos consumidores que conseguiram poupar energia; R$ 2,33 bilhões do adiamento de cobranças pelas distribuidoras; e R$ 790 milhões da energia que foi importada entre julho e agosto do ano passado.

A segunda parte do repasse às elétricas está calculada em R$ 5,2 bilhões, porém o valor ainda não está fechado pela Aneel e será submetido a consulta pública cuja data permanece em aberto. Esta parcela cobrirá um percentual do custo da compra emergencial de energia, que foi feita por meio de leilão, no ano passado, e cujo contrato estará vigendo até 1º de maio.

De acordo com o professor de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV) Mauro Rochlin, “o país, hoje, tem 10% de (geradoras) eólicas em sua matriz energética. Falta investimento e boa regulação do setor para uma maior viabilização”.

Gabriel Emir Moreira e Silva, superintendente da área de Projetos da Fipecafi e hedge de operações financeiras, explicou que a crise de 2021 deu um prejuízo às empresas de energia R$ 30 bilhões, mas R$ 20 bilhões já foram ressarcidos com taxas tarifárias. “Faltam os R$ 10,5 bilhões que agora serão repassados nas contas”. Para ele, os mais atingidos serão consumidores de classe média, que tendem a consumir mais energia, e as empresas. “Pagaremos um terço da conta que falta da crise”, disse.

Consumidor vai pagar por empréstimo bilionário ao setor elétrico

Sem justificativa

Para José Luiz Pagnussat, conselheiro do Conselho Regional de Economia (Corecon-DF), a política de preços na área de energia precisa ser revista. “Não há argumentos para reajustes das tarifas. A crise hídrica não determina aumento de custos ao setor. Os reajustes deveriam ser mais bem justificados para a sociedade, com a indicação clara de quais custos explicam a necessidade da correção das tarifas”, argumentou.

Já a economista Natalie Verndl explicou que o empréstimo deve alongar ainda mais a inflação. “A inflação não deve ceder, por causa de choques de oferta, resultantes da pandemia do cenário internacional, e, agora, com mais um incremento na luz de 2023”, observou.

É a quarta vez que o governo recorre a operações financeiras para conter reajustes elevados nas contas de luz ou para socorrer as empresas de distribuição. A última foi em 2020, quando o empréstimo foi autorizado para minimizar os efeitos da pandemia de Covid-19 sobre o setor — a operação, chamada de “Conta-Covid”, já está sendo paga por meio de repasses adicionais às contas de luz.

Em 2001, quando o país enfrentou um racionamento de energia, o governo inaugurou o uso desse mecanismo para permitir o pagamento de débitos das distribuidoras de forma imediata. Já em 2014, a chamada “conta-ACR” foi liberada para conter o repasse de gastos com termelétricas e do aumento de subsídios e descontos para grupos de interesse, mas nem assim conseguiu impedir um aumento de 50% em 2015.