Pessoas que já tiveram dengue teriam menos chance de ter Zika, diz estudo
Pessoas que já tiveram dengue teriam menos chance de ter Zika, diz estudo

Pessoas que já tiveram dengue teriam menos chance de ter Zika, diz estudo

Um novo estudo sugere que pessoas que já tiveram dengue poderiam ter menos chance de serem infectadas pelo vírus da Zika, que em mulheres grávidas pode levar os bebês a desenvolverem microcefalia. O estudo foi publicado na revista “Science” e liderado pelo médico brasileiro Ernesto T.A. Marques da Universidade de Pittsburgh, nos EUA.

“Nós identificamos que pessoas com altos níveis de anticorpos contra a dengue eram menos propensas a serem infectados pelo zika do que as pessoas com baixos níveis de anticorpos anti-dengue. Isso sugere que pessoas expostas várias vezes à dengue podem desenvolver proteção parcial contra o zika”, explica.

Para Marques isso significa que é possível que uma vacina contra a dengue pudesse fornecer, ainda que temporariamente, alguma proteção contra o zika e poderia ser útil para prevenir a síndrome congênita do zika. “Mas ainda precisamos provar isso”, diz.

Atualmente, a vacina contra a dengue disponível no Brasil não deve ser administrada em pessoas que nunca tiveram a doença. A decisão afeta a distribuição da Dengvaxia, fabricada pelo laboratório francês Sanofi Pasteur. Ela é a única vacina da dengue com registro no Brasil e é aplicada na rede privada de saúde.

O estudo – que acompanhou cerca de 1.500 pessoas vivendo em um bairro que sofreu com o surto de zika no Brasil em 2015 – também fornece evidências de que a epidemia de Zika no país diminuiu porque pessoas suficientes adquiriram imunidade para reduzir a eficiência da transmissão.

De epidemia para endemia

Para o pesquisador, o estudo é relevante porque pode ajudar a esclarecer pontos muito importantes que podem permitir identificar populações com alto risco de serem infectadas pelo zika, prever futuros surtos grandes e possivelmente mitigar ou prevenir futuros surtos.

“O que fica claro é que a população nordestina do Brasil de menor status sócio-econômico estava extremamente exposta ao zika e levará muito tempo para que essa população seja suscetível contra o vírus”, disse.

Marques acredita que é difícil, no entanto, extrapolar essa conclusão para todas as classes econômicas e sociais de todas as regiões do país. “Muito provavelmente, eles não estavam tão expostos e, portanto, são mais suscetíveis a se infectar e desencadear surtos menores, fazendo a transição para um estado endêmico”. A endemia é quando uma doença atinge a população de uma região geográfica específica.

Cuidado com as grávidas

Marques acredita que as grávidas poderiam se beneficiar de um cuidado pré-natal que monitore precocemente a sorologia tanto para dengue quanto para o zika.

“Isso pode ajudar no acesso ao risco de infecção congênita. Um segundo ponto é que é plausível que a imunização contra a dengue possa aumentar os anticorpos anti-dengue e fornecer proteção parcial, mesmo que de curta duração, pode ser útil durante a gravidez. No entanto, isso ainda precisa ser comprovado. É apenas uma hipótese”, explica.

Ainda segundo ele, esta suposta imunização temporária não substituiria uma vacina segura e potente contra o zika, mas uma vacina contra a zika ainda é algo distante.

Coleta de sangue

Os participantes do estudo deram várias amostras de sangue antes, durante e depois da epidemia de zika. As amostras coletadas em outubro de 2014 e março de 2015 foram quase totalmente negativas para o zika, mas em outubro de 2015, 63% mostraram evidências de infecção pelo zika.

Antes do surto de zika, um subgrupo de 642 participantes também havia sido testado para infecção anterior por dengue, e 86% eram positivos. Especificamente, o teste avaliou o nível de anticorpos que os participantes tinham no sangue contra a dengue. A equipe descobriu que cada duplicação dos níveis de anticorpos contra dengue correspondia a uma redução de 9% no risco de zika.

“Isso significa que existem alguns anticorpos de proteção cruzada que a dengue fornece contra o zika”, disse Marques.

De acordo com o boletim epidemiológico divulgado pelo Ministério da Saúde até dezembro de 2018, foram 174.724 casos confirmados de dengue e 3.984 de zika no ano.